terça-feira, 5 de agosto de 2008

História da Calça Jeans Feminina — Parte 2

No final nos anos 50 e início da década de 60, fabricantes da Europa passam a produzir suas próprias marcas de denim. Mantendo as características e o espírito do produto, a França remodelou o jeans e começou exportar para a América. Nessa época, cresce nos europeus — como decorrência, entre outros, do Plano Marshall — a vontade de criar, do outro lado do Atlântico, o “fabuloso” estilo de vida dos norte americanos.
Embora a explosão dos Beatles colocasse a Inglaterra, com o nome "The Swinging Blue", na dianteira dos "Swinging Sixties", tanto na moda como na música, os Estados Unidos ainda exercia forte influência. A Califórnia tornou-se a primeira inspiração quando a filosofia era sol, surf e diversão; nesse período, “o estado do ouro” personificava a imagem do “paraíso”.
Durante a década de 60, é construído o muro de Berlim, surge o videogame, o fotorrealismo, o fax e a pílula anticoncepcional — responsável por uma verdadeira revolução no comportamento sexual feminino. Mary Quant confecciona a minissaia, produto que mais tarde atribuiria ao jeans feminino uma sensualidade ainda maior. Assim como o jeans, as novas fibras sintéticas também faziam sucesso na moda feminina. Tecidos como o banlon e a helanca, facilitavam as formas dos modelos trapézio, tubinhos e até mesmo saias plissadas — fits da época. As estampas tinham motivos geométricos.
A inglesinha Twiggy torna-se a modelo-símbolo dos criativos anos 60 e a primeira top model do mundo. Magérrima, pequena, com cabelo curtinho e imensos olhos realçados com camadas de rímel e cílios postiços, Twiggy se consagrou como um ícone da moda e padrão de beleza para sua geração. Ainda hoje, volta e meia, estilistas e maquiadores a reverenciam em suas criações. Twiggy foi uma agradável febre que tomou conta da Europa e dos Estados Unidos.
Sua aparência quase andrógina — frágil e mignon — teve um efeito devastador na mídia, justamente por se contrapor ao padrão de beleza feminina da década anterior: mulheres voluptuosas e sensuais como Marilyn Monroe. Para se ter uma idéia, Twiggy emprestou nome e rosto para bonequinhas de papel, jogos, canetas, cílios postiços, cabides, meias e até máscaras.
Em 1967, chegou a Nova York com status de estrela e freqüentou eventos da high society. No Brasil, contudo, não fez sucesso nem teve seguidoras de seu estilo — as brasileiras, na época, preferiam ser curvilíneas e não adotavam ao pé da letra os padrões impostos pela moda.
Em 1968, sob a influência do movimento hippie, a moda do denim adere à forma boca-de-sino, à cintura baixa — saint-tropez —, e ao conhecido ditado — quanto mais velho melhor. A onda do artesanato, dos jeans bordados e recortados, foram as mais óbvias manifestações da contracultura.
No Brasil, a garota propaganda da Coca-Cola, Leila Diniz, em "Todas as Mulheres do Mundo", se consagra como atriz e personalidade expressiva do universo feminino, tornando-se, assim como o jeans, um símbolo do inconformismo da época. Em 1968, a atriz foi à Alemanha representar "Fome de Amor", no Festival de Berlim.
Com o movimento Woodstock, o flower-power-hippie propunha a paz e a liberdade e alguns hippies e místicos desprezavam a roupa limpa e arrumada, uma vez que, para eles, era um sinal de comprometimento com o sistema. Neste período, surge a moda unissex. Na decoração, as estampas românticas viram pôsteres nas paredes, os carros têm cores vivas, e a alimentação vegetariana vira moda.
No início da década de 70, as miniblusas e as calças saint-tropez continuaram sendo usadas, fascinando até mesmo o poeta brasileiro, como pode ser constatado na crônica "Umbigo", de Carlos Drummond Andrade, que comenta
"Umbigos andam por aí desafiando tua capacidade de curtir o novo dentro do eterno. Se na praia eles não são percebidos, porque se inserem no quadro global, na rua, no coletivo, na loja, no escritório, são uma presença nova, uma graça diferente acrescentada ao espetáculo feminino, um dom sem destino certo, que é a bonificação de um ano em que tantos perderam na bolsa, mas acabaram lucrando na vista ...”(DRUMMOND, 1972)
Na virada da década, a badalada estação de férias européia Saint-Tropez, que sempre havia sido influente centro de moda, começou a ver o denim reciclado em bonés, sacolas e sapatos, tornando-se a capital da reciclagem e criatividade em denim. Turistas endinheirados e “hippies socialites” chegavam a pagar US$ 500,00 por uma calça bordada. Na decoração das peças valia tudo: linhas coloridas, tinta, contas, conchas, rebites e tudo mais que pudesse ser aplicado.
O look se tornou o uniforme perfeito para a época da discoteca, invadiu butiques do mundo todo — Paris, Londres, Los Angeles e Rio de Janeiro. Assim sendo, todos estes fatores ocasionaram a grande explosão do designer de jeans entre 1977 e 1982 — extraordinariamente, no mercado denim cujo alvo era, predominantemente, as mulheres.
A indústria do jeans também começou a fazer experiências com diferentes qualidades de lavagens, cores e modelos. O corte americano é adaptado para o gosto europeu, ampliando imensamente a gama de cores. Deixa-se de dizer blue jeans, para se dizer apenas jeans.
A partir daí, a Europa começou a influenciar cada vez mais no mercado de denim, na medida em que fabricantes europeus como Peter Goldin (UK), Fiorucci (Itália) e Marithé et Francois Girbaud (França) começaram a produzir estilos que estavam longe do original americano.
A calça jeans com cintura baixa e pernas boca-de-sino ganhava cada vez mais popularidade entre os consumidores de novidades. O denim se tornou moda “criada” e os novos estilos europeus foram aceitos até mesmo nos Estados Unidos.
Na década de 70, surgiram os franceses com uma proposta diferente em termos de modelagem. A calça feminina passou, então, a ter melhor caimento e maior aceitação, começando na Europa e espalhando-se rapidamente pelo mundo. O despojamento dos hippies serviu de inspiração para os grandes fabricantes, que perceberam a oportunidade de inovar nos acabamentos.
Dando início à era da lavagem industrial, desempenhando dupla função: estética e de tratamento dos tecidos. A primeira lavagem de denim foi realizada por meio da técnica de sanforização, patenteada pela Cluett, Peabody and Co.
À medida que o jeans virava moda, as lavagens tornavam-se mais sofisticadas, amaciando o tecido e, até mesmo, alterando sua cor. O stone-washed, desenvolvido pela Edwin e Marithé et François Girbaud, em meados da década de 70, marcou o início da lavagem industrial com o propósito de fazer moda.
A partir do sucesso do stone-washed, surgiram outros processos, como o tratamento à base de ácido e enzimas, entre outros experimentos e interferências manuais. A Leger Milk, da Itália, no final da década de 70, passou a produzir um denim com certa porcentagem de fibra elástica, com a proposta de fazer com que a roupa tomasse formas mais próximas ao corpo. A princípio, a idéia teve poucos adeptos, mas algum tempo depois, quando a Levi's lançou a linha feminina no Reino Unido, as inglesas, literalmente, aderiram à tendência.
Nos anos seguintes, a Europa viu uma explosão desse novo look, especialmente, da Bufalo (França) e da Mustang (Alemanha). O espírito prático que dominou a época determinou um consumo surpreendente de jeans e camisetas.
O jeans de todas as formas (calças, camisas, blusões, jaquetas, coletes, túnicas, saias, vestidos, macacões e até mesmo sapatos e bolsas), várias cores e diversos tipos de acabamentos (delavé, tie die, puído, lixado, escovado, aveludado etc.), deixa de ser apenas uma vestimenta para se tornar a roupa-pele de boa parte da humanidade.
Assim como a calça jeans five-pockets (cinco bolsos), algumas peças também se tornam básicas do armário feminino, na linha jeanswear esportiva e facilmente coordenáveis entre si. Tais como a jaqueta, a camisa safári com lapelas sobre os ombros, a bermuda cargo com bolsos nas pernas, os chemisies, os shorts e as saias curtas ou longas.
Com a explosão do designer do jeans — que nunca foi tão grande na Europa como nos Estados Unidos — é marcado o pico das vendas em massa dos artigos em denim. Muitas das butiques especializadas que tinham atingido o topo, em meados de 1970, foram rejeitadas pelos consumidores com as mudanças das tendências de moda.
A superprodução tornou-se um problema. As maiores companhias, cuja mola mestra era o denim, ficaram preocupadas, o que levou a Levi's a voltar a produzir o jeans básico a fim de resolver esse problema. O modelo 501, ao ser relançado, tomou-se tendência de mercado. As outras marcas não demoram muito para seguirem o mesmo caminho escolhido pela Levi's.
O Levi's 501, que datava, inicialmente, de 1873, com a etiqueta vermelha (Red Tab), reapareceu pela primeira vez em 1936, foi resgatado para satisfazer a demanda pelo jeans clássicos.
Quando os negros norte-americanos começaram a ganhar mais espaço e maior liberdade para expressar sua criatividade e talento musical, surgiram o soul e o funk norte-americano (de difícil aceitação pela audiência branca); então em seguida surge o jazz (som com percussão mais latina), atribuindo um sentimento mais pop, propagando a música negra no mundo.
A fusão do soul e do funk com o jazz deu origem, nos anos 70, à disco-music, gênero musical que tira a black-music dos guetos, projetando-a nas discotecas de Chicago, Nova Iorque e Filadélfia, onde havia festas totalmente dançantes, freqüentadas por um público alternativo.
Os "Anos da Disco", também conhecidos como "A Era do Brilho", foram uma época de autoafirmação das mulheres frente à sociedade machista, elas utilizavam figurinos sexy e luxuosos para demonstrar seu esplendor.

Dancing’ Days, Studio 54 e Village People e os símbolos da Era Disco

Como em qualquer movimento cultural, o vestuário trazia um certo simbolismo, as roupas e maquiagens glamourosas expressavam alegria, espírito vibrante e a busca pela diversão. O cetim e a seda evocavam o glamour dos anos 20, trazendo luxo e esplendor para as mulheres.
O jeito sexy de se vestir foi totalmente incorporado ao figurino feminino — os tops, os vestidos frente-única, as calças jeans cintura baixa e boca-de-sino, as leggings coladas e transparentes — abrindo espaço para que as mulheres passassem a ter mais liberdade para escolher o que vestir.
No Brasil, em 1978, a novela global "Dancing’ Days", de Gilberto Braga, sob a direção de Daniel Filho, modernizava o processo de visualidade da imagem. As frenéticas, ao som de Dance a "Little Bit Closer" e "Dancing Days", se consagravam nas danceterias brasileiras. A marca nacional de jeanswear Staroup inovava na comunicação com o público-alvo, inserindo a marca no visual merchandising do cenário da discoteca da novela, onde a atriz Sônia Braga produzia o show nas pistas.
A moda disco despertava, nos jovens, o desejo se tornarem reis e rainhas das pistas de dança. Os sapatos plataforma, as meias lourex, as lantejoulas, a purpurina, os shorts, as roupas em cores vibrantes com muito brilho dos lamês e strass, faziam parte do figurino das pistas.
A música, com os arranjos feitos por instrumentos de cordas e sopro, deu um suporte para uma impostação de voz feminina, atribuindo-lhe maior liberdade para interpretar as músicas ao seu modo. A beleza que a música disco ganhava com a participação feminina favorecia a queda de antigos preconceitos da sociedade a respeito das mulheres.
Quando as letras para vocalistas femininas, antes caracterizadas pelas incertezas, melancolia de espírito e indecisão, traziam agora mulheres inteligentes, controladoras do seu próprio destino e decididas. Música como "Queen of Disco", de Ruby Andrews; "Catch Me on the Rebound", de Loleatta Holloway’s e "I Will Survive", de Gloria Gaynor, são exemplos de músicas em que as chamadas divas da disco interpretavam mulheres absolutamente independentes.
Além das mulheres, outros grupos antes discriminados começavam a ganhar mais liberdade. A disco music revolucionou os modos de socialização, levando ao fantástico mundo da discoteca, pela primeira vez na história, pessoas de todas idades, diferentes origens étnicas e orientações sexuais, onde eram atendidos com dignidade.
Porém, havia algumas discotecas mais “sofisticadas” escolhiam a dedo as pessoas que podiam entrar no estabelecimento, assim como a Studio 54, que permitia a entrada somente das pessoas mais bonitas ou famosas.
Entretanto, mesmo nesses lugares encontravam-se todos os tipos de pessoas, que mesmo com suas diferenças, se respeitando e seguindo a ordem de todas as casas noturnas, a diversão. O comportamento dos adeptos da disco era inteiramente direcionado ao entretenimento; a dança, muitas vezes, era acompanhada por bebidas e drogas vendidas e consumidas no local; o sexo era explícito, feito em espaços específicos da boate.
O filme "Studio 54", que conta a história da discoteca mais famosa de Nova York, retrata a o estilo de vida da época, no qual a liberdade imperava. O filme Boogie Nights ilustra bem os ideais dos jovens da época.
Entre inúmeros outros filmes que abordaram "A Era Disco Music", destacam-se: "Saturday Night Fever", "Grease" e "Thanks God! It’s Friday". A década de 70 ficou marcada, pela crise do petróleo, que conduziu o mundo a uma séria convulsão socioeconômica. O sonho de viver de paz e amor, expressado pelo movimento hippie, dilui-se no tempo; contudo o jeans — o traje da época — continuou.

Referencias bibliográficas
CATOIRA, Lu. Jeans, a roupa que transcende a moda. Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2006.
HOLLANDER, Anne. O sexo e as roupas: a evolução do traje moderno. Rio de Janeiro: Rocco, 1996.

Fonte
ZIBETTI, Silvana. Jeans, um símbolo da cultura jovem. Dissertação (Mestrado Mídia e Cultura) – Faculdade de Comunicação e Turismo, Universidade de Marília, Marília, 2007.

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