domingo, 31 de agosto de 2008

O jeans dos jovens — do universo underground ao restrito mundo do luxo

No princípio, os jeans, lançados inicialmente em uma única cor básica, eram bastante duros e desconfortáveis, as calças eram tão grossas que ficavam em pé sozinhas; com o tempo e o desenvolvimento das indústrias têxtil e química, o azul denim ganhou novas tonalidades, tornando-se bastante agradável de olhar e as calças ficaram mais confortáveis.
Originalmente, os jeans expressam intensamente os valores democráticos, pois no decorrer de sua adoção pelo mundo, não houve distinção de riqueza ou status, foram usados por pessoas de todas as classes sociais, etnias e idades. Nesse sentido, Malcolm Barnard, em Moda e comunicação, afirma que “o jeans pode ser explicado como uma tentativa de recusar toda a identificação de classe ou dela ficar fora” (BARNARD, 2003, apud ZIBETTI, 2007).
Segundo o antropólogo inglês Ted Polhemus (1994), o jeans constitui o primeiro exemplo de “vestir esportivamente em que as pessoas da classe média adotam o estilo da classe operária” (In BARNARD, 2003, apud ZIBETTI, 2007). O jeans se consagrou contestando valores não-democráticos que se encontram numa sociedade que faz e opera de acordo com as distinções de classe, riqueza e status. Os jovens, no período do pós-guerra, vestiram o jeans como um desafio aos valores da sociedade vigente, que valorizava a riqueza, o status, o elitismo e o esnobismo, comuns na América, assim como no Velho Mundo. O jeans teve seu progresso igualitário nos anos 1960 e 1970, depois se afasta dessa trilha; recentemente, caminha em sentido bastante contrário, assegurando o conceito de premium jeans propagado pelas grifes do mercado de luxo.
As primeiras pessoas a adotarem o jeans para todas as ocasiões foram pintores e outros artistas, na região Sudoeste dos Estados Unidos. Em seguida, nas décadas de 30 e 40, artistas de outros lugares também começaram a usar jeans. No entanto, os jovens foram os verdadeiros responsáveis pela propagação do jeans em torno do mundo, quando grupos de esquerda, tais como os beatniks, as gangues de motoqueiros, mais tarde os hippies, o adotaram como meio visível de anunciar seus sentimentos de oposição ao establishment e a cultura vigente numa América conservadora, de classe média voltada para o consumo.
O jeans imediatamente foi adotado pelos que criticavam a ideologia influente ou predominante da época, a fim de estabelecer uma oposição ao sistema de idéias criticado e defrontado, constituindo-se num símbolo de resistência à ideologia dominante, o mais usado pela publicidade na abertura pós-ditadura. Porém, quase que simultaneamente à sua efetivação como um signo de oposição às identidades de classe e status social, o jeans passava a ser incorporado pelo sistema que se propunha criticar.
Assim como era usado para expressar o desejo de fugir aos limites impostos pelas identidades de classe, ou de recusá-las, era usado exatamente para instituir essas identidades. Desse modo, “estava se tornado domesticado e voltando para o trabalho de construir e sinalizar exatamente os gêneros de classe de que pretendia escapar” (BARNARD, 2003, apud ZIBETTI, 2007).
Assim correu a história, depois de décadas, em que os jovens adolescentes e as crianças eram simples cópias de seus pais: como decorrência, dentre outras causas, da Segunda Guerra Mundial, os jovens norte-americanos começaram a exigir e estabelecer suas próprias identidades. DURAN (1988) relata que, em 1940, na Universidade de Berkeley, os alunos do segundo ano adotaram o jeans como um sinal de distinção, impedindo o seu uso aos calouros. Percebendo a oportunidade, a direção comercial da Levi's aliou-se aos veteranos, insistindo com as autoridades universitárias para que o uso privativo fosse garantido.
Nos anos 1940, tempos de guerra, os soldados norte-americanos levaram seu par favorito de calças de denim ultramarino, para o outro lado do Atlântico, tentando evitar o roubo destes preciosos artigos. Com o fim da guerra, houve grandes mudanças no comportamento da sociedade, marcando o fim de uma era e o começo de outra. As calças em denim tornaram-se menos associadas com workwear e mais associadas com os desocupados, após a “prosperidade” norte-americana na guerra, atribuindo ao jeans uma conotação pejorativa perante os olhos da sociedade dominante.
Em 1946, estudantes, niilistas, poetas escritores, artistas, em torno do mundo, começavam a tomar conhecimento do movimento existencialista, propagado pelos filmes realistas da Nouvelle Vague, que tinha como mentores o filósofo francês Jean-Paul Sartre, a escritora francesa Simone de Beauvoir, o argelino conhecido como profeta do absurdo Albert Camus, enfim, fruto do pensamento dos jovens esquerdistas da Sorbonne, que acreditavam que a vida não fazia sentido e a própria existência se provara absurda.
Para Antonio Bivar (1988), em O que é punk, o que o Existencialismo tinha de mais óbvio era a moda e Juliette Grecco era o modelo. Não importava se fosse moda ou filosofia, mas as famílias da época queriam que seus filhos fossem tudo, menos existencialistas. Pois a rebeldia do movimento trazia consigo o excesso de pessimismo, excesso de álcool, excesso de drogas, quando não excesso de violência, promiscuidade, falta de dinheiro e uma aparência que causava rejeição, visto que estes jovens adotaram a roupa barata dos trabalhadores, para ser usada como símbolo de resistência.
Allen Ginsberg, poeta obsceno estadunidense que ficou conhecido pelo seu livro de poesia Howl (Uivo,1956), juntamente com seu amigo e escritor Jack Kerouac, autor de On the road (Pé na estrada, 1955), assumem um estilo de vida bizarro tornando-se os símbolos da geração beat e os autores preferidos dos aventureiros, incentivando os ávidos por liberdade a trilharem novos rumos, protegidos pela velha calça azul e desbotada.
No início dos anos 1950, o fenômeno musical do rock and roll estoura com Elvis Presley que vestia jeans. As calças com bainhas viradas para fora, facilitavam os movimentos da dança nesse novo e frenético ritmo. Lado a lado com a popularização do subgênero musical rockabilly, o jeans acaba conquistando também os jovens.
Em 1953, o ator Marlon Brando deu vida ao personagem principal de The Wild One (O Selvagem), sob a direção de Lazlo Benedek. Uma tranqüila cidade da Califórnia é invadida por uma gangue de motoqueiros arruaceiros e problemáticos. Em meio ao terror que sua gangue está causando na cidade, Johnny (Marlon Brando) apaixona-se pela filha do policial Harry Bleeker (Robert Keith), Kathie (Mary Murphy). Johnny não deve enfrentar apenas a conflito gerado pela diferença social que o separa de Kathie (como a ira e o preconceito gerados), mas também um psicótico rival conhecido como Chino (Lee Marvin), que promete complicar ainda mais a situação. Johnny, o personagem interpretado por Brando, sempre usava sua jaqueta de couro e as calças jeans com barras viradas. O filme, graças principalmente ao ator, foi um verdadeiro marco cultural da época. A caracterização que Marlon Brando atribuiu ao seu personagem marcaria toda uma geração de artistas, desde James Dean a Elvis Presley, os quais adotavam o estilo rebelde mostrado no filme.
Dois anos depois, em 1955, no filme norte-americano Rebel Without a Cause (Juventude Transviada), dirigido por Nicholas Ray, James Dean interpreta o drama de Jim Stark, jovem problemático, que vivia um dramático conflito de relacionamentos, causando constantes problemas aos seus pais. O figurino de Jim Stark, inspirado no selvagem Johnny (Marlon Brando), aderiu à calça jeans com as barras viradas para cima, que era usada com t-shirt branca, sob jaqueta de couro marrom estilo aviador, e botas.
James Dean, Elvis Presley e Marlon Brando, ícones da juventude transviada, anos 1950

Em 1957, quando Elvis Presley cantou e dançou em Jailhouse Rock, seu uniforme de presidiário era a imagem da virilidade. Com seu jeito sensual de balançar as cadeiras, o cantor trazia consigo inovação nos modos de vestir e de comportamento, uma nova visão de mundo. Daquele dia até hoje, o denim e a música tornaram-se inseparáveis, principalmente nas estratégias de comunicação da marca Levi's.
James Dean e Marlon Brando se consagram como símbolos da "juventude transviada", o retrato dos "delinqüentes juvenis", influenciando decisivamente os costumes de uma época marcada pela repressão, atribuindo ao denim o toque final para sua eternidade. Os anti-heróis da "aparentemente" certinha Hollywood conferem ao jeans uma definitiva consagração entre os jovens, tornando-o a roupa predileta da geração rock’n’roll. Então, os anos 1950 ficaram marcados pelos jeans escuros, t-shirts, suéteres e jaquetas de couro. Já para as garotas, as saias rodadas e as cigarretes eram peças curingas para dançar à vontade.

Peter Fonda e Dennis Hopper em Easy Ryder, 1969

Na década seguinte, o filme Easy Rider (Sem Destino, 1969), um clássico dirigido por Dennis Hopper, retrata a juventude dos anos 1960, refletindo as atitudes e as aspirações de uma geração inquieta. Dois motociclistas (Peter Fonda e Dennis Hopper) lançam-se numa odisséia, costa a costa, em busca da liberdade e da legítima América, numa interminável viagem ao longo da Route 66, levando novamente a calça jeans às telas de cinema. Uma aventura surpreendente devido à diversidade de experiências, desde o encontro com uma comunidade hippie, passando pelas drogas até a descoberta de uma casa de prostitutas, em New Orleans.
No mesmo ano de lançamento do filme, ocorre o maior festival musical efetivado desde então. Woodstock foi realizado numa pacata cidade norte-americana, reuniu quase um milhão de pessoas, que viajaram milhas e milhas até chegarem ao local. Alguns de carona, outros andando. Apresentaram-se no evento os grandes ídolos do rock, tais como Jimi Hendrix, The Rolling Stones, The Who, Sky and The Family Stone, Blood, Sweat and Tear e muitos outros artistas e bandas, sempre com o visual predominante do jeans.

Joe Cocker e Jimi Hendrix em Woodstock, 1969, propagando o denim e o estilo hippie

Durante a década 60, o jeans começou a ganhar popularidade entre os jovens europeus, através da política de divulgação do Novo Mundo por meio do star system. O fenômeno é de tal maneira impressionante, que nem os países de Leste Europeu — sempre resistentes em aceitar as modas ocidentais, símbolo de capitalismo e devassidão — escapam à euforia. Qualquer turista que tenha visitado algum daqueles países, usando uma calça Levi's, certamente, não deixou de ser assediado por jovens sedentos de possuí-las, fazendo-lhes propostas diretas de compra. Em Portugal, na época, "as verdadeiras Levi's" eram compradas dos marinheiros, perante o ar reprovador das autoridades e de adultos mais conservadores. Nas escolas, chegou ser proibida, sob a alegação de que seus arrebites em metal poderiam destruir as carteiras escolares.
Os jovens da época tornam-se os grandes responsáveis pelo triunfo dos jeans, sobretudo na Europa, onde o seu uso simbolizava rompimento com as normas convencionais e rejeição dos códigos estabelecidos, associando-se o traje à liberdade, flexibilidade e sedução.
Os jeans rebateram também a lógica da hierarquia descendente, uma vez que, em vez de se imporem a partir das classes superiores, atingem o estrelato começando por vestir as classes menos favorecidas. O esclarecimento do fenômeno, de acordo com alguns especialistas, está na capacidade de resistência e praticidade do tecido, que não precisa ser passado a ferro, suja pouco e é esteticamente agradável.
Blue jeans LEVIS, 1950-1960

Por essas e outras razões o jeans resiste ao longo do tempo e os jovens passam a usá-lo cada vez mais puídos e desbotados, deixando entreabrir pequenas partes da peça através de rasgos feitos propositalmente; consagra-se como tradicional azul, apesar de já ter aparecido nas mais variadas cores, sempre irreverente, utilitário e prático.
Os Beatles se inspiraram no espírito aventureiro e esportivo, nos piratas, nos cowboys dos filmes do velho Oeste norte-americano, nos aviadores e motociclistas, criaram um visual rebelde e jovem. Eles usavam jeans desgastados e rasgados, muitas camisetas lavadas, tinturadas e estonadas, ou camisetas pólos também desgastadas.

O jeans dos Beatles

A partir da turbulência do pós-guerra, e mais tarde, nos anos 1960, com a fomentação dos protestos juvenis e também na música, com os cabeludos Beatles agredindo a tradicional sociedade inglesa, surgem as primeiras antimodas. A moda viu-se desestabilizada e se destacam diferentes grupos e subgrupos que faziam parte de uma cultura anticonformista jovem, com maneiras de vestir próprias, definindo um novo processo social, a contracultura.
Então, surgem diversas tribos em torno do mundo, tais como os violentos blousons-noirs (blusões-negro), na França, os hedonistas beats (“retirantes”) e os selvagens hell’s angels (anjos do inferno), nos Estados Unidos, os nostálgicos teddy boys (meninos de pelúcia), na Inglaterra. Essas tribos adotaram o jeans como um signo de manifestação de protesto, encontrando nos modos de vestir uma forma de expressão imediata de suas ideologias — a aparência.
Os rockers (roqueiros) e skinheads (carecas) adotam o jeans como símbolo de resistência dos valores tradicionais classistas dos operários ingleses. Os mods (modernos) começam a usar jeans porque era moderno. Anos depois, no final dos anos 1960, os hippies atribuem ao jeans o sentido de liberdade. Mais tarde, em meados da década de 70, o jeans torna-se a roupa-pele dos punks (podres) imputando ao denim o significado de rebeldia e o espírito contestador deste movimento.
O festival de Woodstock divulgou para o mundo o flower-power-hippie e a proposta de liberdade que alguns hippies e místicos que desprezavam a roupa limpa, já que a consideravam um sinal de comprometimento com o sistema, eles adotaram o jeans como símbolo de protesto contra o sistema capitalista, influenciando no surgimento da moda unissex.

Foto do público do Woodstock, em 1969

Ainda durante os anos 1960, as grandes marcas passaram a organizar concursos para premiar quem criasse adornos personalizados para as calças jeans. Logo depois, surgiu a moda de usá-los delavées (desbotados), como se já estivessem surradas e, até hoje, são vendidas com aspecto de usadas. No final dessa década, os jovens passaram a comprar suas calças jeans brechós, já rasgadas ou com os famosos patches (remendos). Na virada da década, as minicalças jeans com elástico na cintura, junto com as camisetas, passam a ser usadas também pelas crianças.
No Brasil, os jovens foram às ruas juntar-se às manifestações estudantis contra o golpe de Estado e a tirania do governo militar, em 1968, causando uma revolução também no próprio modo de vestir. Para facilitar as correrias nas passeatas, eles substituíram os mocassins, feitos sob medida, pelas sandálias franciscanas e pelos tênis.
As minissaias e as tradicionais calças jeans ganharam as ruas, associadas aos blusões vermelhos de goleiros e às camisetas esportivas, tornando-se verdadeiros uniformes para os universitários.
Nessa época, os meninos usavam smoking para irem aos bailes dançantes, alguns alugavam a o traje a rigor e, para economizarem dinheiro, vestiam uma Levi's preta e alugavam somente o paletó. Nos pés, para esta ocasião, os sapatos eram mocassins.
No início da década de 70, os rapazes chegavam comprar as jaquetas e casacos dos próprios militares, para compor o visual esportivo criado a partir do jeans. Nessa época, os adolescentes, sobretudo os hippies, aderiram ao uso das jaquetas jeans de patchwork (retalhos), rebordadas em linha ou adornadas com adereços de metal.
O filósofo francês Roland Barthes (1976) afirmou que nesta época “surge na sociedade algo tão novo e revolucionário como a moda dos anos 60: à juventude não importa mais ser vulgar ou distinta, ela deseja simplesmente ser” (BARTHES apud ZIBETTI, 2007). Ao longo da história, não havia sido a primeira vez que os jovens usavam suas próprias modas ou que a moda se inspirava nas ruas, mas era a primeira vez que a moda era lançada pelos jovens.
Durante a década 70, para passeios, o jeans continuava ditando a moda, combinado especialmente com camisa cacharel de gola alta rulê, sob suéteres e camisas Lacoste, para ambos os sexos. Nos anos 1970 e 1980, os homens usavam calças de veludo cotelê ou denim com camisas de listras finas, estampas florais ou blusões de beisebol, nos ambientes de trabalho.
Abolindo a gomalina e estabelecendo a barba e os cabelos longos, os hippies, com uma boa dose de imaginação, saíram às ruas propagando “a paz e o amor”. Depois da liberação total da moda, em virtude da antimoda que surgiu das ruas nos anos 1960, os anos 1970, marcados pela crise do petróleo, viram os sonhos diluírem-se no tempo, mas o jeans — o traje de época — continuou com silhueta larga, como as calças boca-de-sino ou “patas-de-elefante”, ou ainda, com silhueta sequinha, tão justa como a das calças dos roqueiros, que, para vesti-los, precisavam deitar-se e puxar o zíper violentamente para abotoá-los. Os movimentos políticos desaparecem dando lugar aos movimentos que levantavam a bandeira das minorias em defesa de seus espaços na sociedade — gaypower, black-power, rasta, skinheads e feminismo.
Na década de 70, os “respeitáveis” adultos e idosos resolveram imitar os filhos usando denim. A cultura do jeans estava associada à juventude e todos queriam parecer jovens. Não demorou muito para a customização individual do jeans, que era tatuado com palavras, desenhos e símbolos, se tornar tendência, virando padronização industrial, produto comercializado. Então, o jeans passou a ser confeccionado com rasgos e puído, com várias opções de acabamentos: sujo, manchado ou escrito.

Capa do disco Sticky Fingers dos Rolling Stones, 1971

Os Rolling Stones entraram nos anos 1970 como a maior banda do mundo, pois os Beatles já não existiam mais, e o fim da Banda de Liverpool os favoreceu. O primeiro álbum oficial e inédito dos Stones, na década, o 15º de sua carreira, foi o Sticky Fingers (Dedos Duros), lançado em 1971, cujo título e a capa sugeriam a expressão Sticky Cock (Pau Duro). Assinada por Andy Warhol, a provocativa capa continha um zíper de verdade no lugar do zíper da calça jeans, procurando demonstrar a verdadeira origem do som dos Stones. A foto do jovem na capa não é de Mick Jagger, como muitos acreditavam, mas do ator pornô Joe Dallessandro, que trabalhava nos estúdio The Factory, de Warhol. O zíper podia ser aberto e dentro apareciam os mesmos quadris, cobertos por uma cueca branca. Na época, a capa causou polêmica no mundo inteiro, foi proibida em alguns países, em outros, era exibida como uma revista pornô, embalada com plástico preto.
Sticky Fingers, cuja trilha sonora fazia apologia ao lema “sexo, drogas e rock in roll”, foi o primeiro álbum lançado pela nova gravadora da banda, a Rolling Stones Records, continha também, pela primeira vez, o logotipo da boca vermelha em fundo amarelo, que apesar de ter sido atribuída ao Andy Warhol, na realidade foi criada pelo designer norte-americano John Pasche. A capa foi desenvolvida a fim desviar a imagem de violência que havia sido associada à banda após o escândalo do festival de Altamont, na Califórnia, no qual cinco pessoas foram mortas durante seu show. No entanto, é claro, ela não poderia deixar de provocar os conservadores. A audaciosa criação de Warhol atribuiu uma conotação mais sexual e menos violenta à banda, além disso, imputou ao jeans, mais ainda, a imagem irreverência e musicalidade.
A calça jeans, que, no Brasil, já havia sido chamada de calça faroeste, de calça rancheira e também de calça lee, ganhou etiqueta de grifes brasileiras produtoras das calças confeccionadas em denim. A Ellus foi criada por Nelson Alvarenga, em 1972. Hoje é uma das líderes de mercado no segmento jeans de luxo nacional, mas também tem exportado para Chile, Europa, Estados Unidos e Japão.
Em setembro de 1974, Renato Kherlakian lança, no Brasil, a Zoomp, marca de jeanswear originalmente destinada ao público jovem, que mais tarde deu origem à Zapping. As duas marcas, em pouco tempo, tornaram-se símbolo de status social para os brasileiros. Renato Kherlakian é o criador do primeiro sexy jeans nacional — nome da coleção da Zoomp, lançada em 1979. Ele também é o responsável por transformar o raio amarelo em um dos maiores objetos de desejo da juventude brasileira da época.
A Diesel foi fundada, em 1978, por Renzo Rosso e Adrianao Goldschimied. O nome Diesel foi escolhido porque transmite uma sensação internacional e é pronunciado do mesmo modo em todas as nações, além de ser o combustível que move o mundo. Em 1985, Rosso comprou a parte de Goldschimied e revolucionou o design dos jeans. Em 1988, Wilbert Das, atual diretor criativo da marca, juntou-se à companhia como assistente de estilo. A partir de 1991, a agência Paradiset, de Estocombo, instituiu o slogan Diesel For Succesful Living (Para viver com sucesso) passou a ser interpretado de maneira irônica na comunicação. Através de sua publicidade transgressora, a marca conquistou os jovens em torno do mundo. Hoje, é reconhecida como a precursora no segmento premium jeans e com uma das marcas mais prestigiadas mundialmente, sobretudo pelos jovens consumidores globais.
Quando entram em refluxo os movimentos sociais de que se nutriu, o jeans já está suficientemente implantado em todo o mundo. Entre 1966 e 1976, ele esteve no seu apogeu. Estabilizou-se a partir de 1977, sendo sustentado pela força da propaganda e das etiquetas de prestígio, que tentaram “sofisticá-lo”, mas sem conseguir recuperar o anterior ritmo de difusão, entrando, então, na maturidade do seu ciclo de vida.
Nos anos 1970, as roupas de noite deixam de ser tão formais, já que a presença marcante nas boates e danceterias exigia jeans muito justos, acompanhados das blusas de malha com muito brilho e das sandálias de salto agulha. Para a maioria dos norteamericanos, as festas blackie-tie (a rigor) estavam em desuso. O filme Manhattan, de Wood Allen, mostra essa transição, associando o visual formal ao informal. As atrizes da época, como Diane Kaeton, Candice Bergen, Ali McGraw e Meryl Streep, não estrelavam mais com roupas sensuais, excêntricas e exuberantes, mas sim usando jeans, camisetas, pulôveres, blazers e blusas de seda.
Nos anos 1980, a sétima arte consagra os filmes Mad Max e E.T., filme em que o diretor, Steven Allan Spielberg, veste um alienígena com a roupa típica norte-americana — jeans e camisetas. Década marcada pelos movimentos de solidariedade e pelo culto ao vídeo clipe. Os Young Urban Peoples —Yuppies, jovens ávidos por dinheiro, status e poder — destacam-se pela sua forma de vestir, pois trocaram a severidade dos tradicionais ternos pela funcionalidade das calças jeans, blazers e gravatas. Já a maioria dos estudantes usava jeans, camisetas ou blusões de moletom com nomes das universidades ou dos times, sobretudo de basquetebol, além dos óculos escuros.
Esta década, também, teve seu início caracterizado pela antimoda e a imagem do pauperismo, já que a estética da pobreza do movimento punk, que surgiu em Londres em meados da década de 70, influenciou os criadores japoneses Kenzo, Isey Miyake e Rei Kawakubo. Estes estilistas dominaram a moda européia quebrando os padrões préestabelecidos das formas, introduzindo novos volumes, ombros estruturados, peças sobrepostas, escondendo a silhueta. A estética desta vez pedia jeans super rasgados. Tratava-se, na verdade, de uma proposta de anticonsumo, de uma antimoda, à qual muitas grifes aderiram.
Como preto toma conta das passarelas, registrando o período crítico da economia mundial, o jeans black também assume posição de destaque, ao lado do tradicional blue. No passado, calças e jaquetas em denim preto fizeram sucesso na pele dos foras-da-lei como Elvis Presley, Johnny Cash e dos Ramones, o black denim adquiriu a significação de ser bad (mau). O blue jeans passou de símbolo de contestação à objeto de consumo, dirigido a grupos bem definidos. Cujas regras de interesse são produto funcional, bem adaptado à vida do dia-a-dia, e com bom preço.
Inicialmente, com o propósito de atender o mercado de moda prêt-à-porter, em 1981, no Brasil, Tufi Duek lança a Forum. Em 1985, a grife ampliou sua linha ao jeanswear e, a partir de então a marca ganha expressividade no mercado nacional. Em 1997, com a abertura do mercado, a Forum lança sua marca internacionalmente, passando a fazer parte do universo das marcas globalizadas.

Kate Moss, anúncio da campanha do verão 2000, da Forum

Em 1987, Valdemar Iódice desenvolve uma moda jovem streetwear e lança a brasileira Iódice. Fiel ao conceito de simplicidade de formas e cores, nas coleções masculinas, combinava jeans e camisetas, já no feminino, roupas leves feitas com finos tecidos e detalhes drapeados se integravam ao jeans despojado, próprio para atender aos desejos da juventude brasileira da época.
Em 1989, o símbolo do mundo comunista cai. A queda do muro de Berlim simboliza o início da fase da globalização e mundialização das culturas, propagando tendências pelos cinco continentes. Os jovens testemunharam o fato vestindo jeans, símbolo de revolução e contracultura.
Nos anos 1990, as bandas de rock Nirvana e Alice in Chains, de Seattle, Estados Unidos, que vinham chocando o mundo, introduzem o estilo grunge (sujos) na música e na roupa com os principais fundamentos deste movimento de estilo — coturnos, camisa xadrez, jeans puídos e sobreposições de camisetas. Volta o estilo hippie, mais sofisticado, conceituado como hippie chic.
A tecnologia dos tecidos amplia a gama dos sintéticos e cria as microfibras e os “tecidos inteligentes” tornando as roupas mais práticas e confortáveis, e o homem volta a usar peças mais justas e se permite ser vaidoso.
Em Babado Forte, Erika Palomino afirma que "com o caminho contrário estabelecido (das ruas para as passarelas), todo mundo quer se sentir jovem, quer vestir-se com a roupa dos jovens. Enquanto nos anos 80 o que importava era ter dinheiro, os 90 vão se tornando uma época em que juventude passa ser um status importante de se ostentar... "(PALOMINO,1999, apud ZIBETTI, 2007).
Neste cenário, o jeans ganha cada vez mais adeptos. O visual esportivo, dos ídolos da música pop, é adotado com inovações pelos jovens. Sob a influência dos vídeo clipes transmitidos pela televisão, eles passam a copiar as roupas dos ídolos do funk e do rap, usando bonés virados para trás e cordões dourados. A calça jeans, baggy e semi-baggy, o jeans colorido, o jeans em calça, jaqueta, em bermuda, em shorts, em jardineira etc., continuou sendo a roupa favorita do vestuário informal, junto com os bodies, as t-shirts, as camisetas regatas, as blusas baby look e “segunda-pele”.
Em 1992, com camiseta e cara-pintada, a juventude do Brasil vai às ruas pedir o impeachment do então presidente Fernando Collor de Melo, vestindo jeans, um uniforme que também tem sido usado, inconscientemente, pelos adeptos do movimento sem-terra. O sociólogo e economista, Fernando Henrique Cardoso assume a presidência da república. A ECO 92 discute os problemas relativos ao meio ambiente. Ronaldinho e Guga são os destaques do esporte nacional.
A Forum aposta nas referências culturais brasileiras para o desenvolvimento de sua coleção e campanha publicitária, deflagrando, pela primeira vez na década de 90, a discussão em torno da necessidade de uma identidade brasileira na moda. Inspirandose no visual de Carmen Miranda, começa vender, em New York, calças jeans brasileiras adornadas com bananas.
Em 1995, a M.Officer, de Carlos Miéle, se destaca pela preocupação com a preservação do meio ambiente, lançando um produto até então inédito em todo mundo: o ecodenim — jeans feito com 80% de algodão e 20% de PET (fios de plástico obtidos a partir de garrafas descartáveis não biodegradáveis). Um ano depois, os europeus, sobretudo Giorgio Armani, integraram este produto às suas coleções.
Em seguida, é lançado o trio — o jeans mais moderno, com 30% de PET, apenas 15% de algodão, os 55% restantes de liocel (a fibra do tencel). Desenvolvida pela Coultards Fibers, uma das mais importantes produtoras de fibras do mundo, o tencel é obtido a partir de árvores plantadas em áreas de reflorestamento, com uma tecnologia não poluente. O tencel também foi lançado no Brasil pela M.Officer. Tanto o trio, como ecodenim, foram desenvolvidos pela Swift Textiles, empresa norte-americana que vem se direcionando à pesquisa de novos tecidos, com cada vez menos algodão.
No fim da década, entraram em moda os jeans stretch, bem ajustados e, a t-shirt, que já era o seu par perfeito, após o aparecimento do silk-screen, ela virou uma mídia vinculadora de idéias, ostentando as mais variadas estampas, slogans, nomes ou logotipos de grifes, atravessou a década com força total, consagrando, definitivamente, a parceria.
Na mesma época, no Brasil, Tufi Duek e o designer Giovanni Bianco juntaram-se para produzirem o livro e a exposição Photojeanic, o Culto do Jeans, no Museu de Arte Moderna, em São Paulo. Photojeanic (do francês, fotogenia), além de ter um significado relativo ao projeto, ortograficamente, faz a junção da palavra photo com o termo jeans, por esta razão se tornou o título tanto do livro como da exposição. Desse projeto, participaram cinqüenta e seis fotógrafos, nacionais e internacionais, que receberam um jeans cada um, para fotografá-lo na sua visão mais convincente, com total liberdade: de maneira comercial, irônica, dramática, bem-humorada ou artística. A intenção era ilustrar a evolução do produto na visão de cada fotógrafo.
No final do século, as lojas Levi's norte-americanas começaram a comercializar personal denim: o jeans feito sob medida. Sob encomenda, a calça ficava pronta em três dias, custando apenas um pouco mais do que a normal. Além dessa inovação, em quinze pontos-de-venda espalhados pelos Estados Unidos, peças de época foram resgatadas, no melhor estilo vintage. Em São Francisco, na fábrica de 1906, calças, jaquetas e camisas dos anos 1930, 1950 e 1960 voltam a ser confeccionadas em edições limitadas, nas mesmas condições do passado, com as máquinas dos anos 1920, conservando os mesmos detalhes, tais como a linha vermelha que corre na barra interna das costuras laterais, no bolso direito, o logo na tarjeta vermelha (Red Tab) com o "e" maiúsculo, como foi de 1936 até 1970. O segundo bolso só apareceu a partir dos anos 50, quando a etiqueta no passante da calça deixou de ser de couro para ser de zetex. Além dessas peças vintage, a marca lançou o conceito dos originals, resgatando, entre calças, camisa e jaqueta, sete modelos (Red Tab) em jeans da década de 50, 60 e 70, com tecnologia contemporânea. A Silver (prata), uma linha mais fashion e bastante jovem, invadiu as prateleiras da Levi's, no segundo semestre de 1998.
Em 1999, na vira do milênio, novamente, a Levi's regressa ao passado. Porém, desta vez, foi para lançar a sua mais expressiva linha de vestuário denim, batizada de Levi's Engineered Jeans (LEJ), que viria a revolucionar a forma de usar jeans, que passou a ter um corte ergonômico, com autoria da designer Rikke Corp. A nova peça surgiu do deslocamento natural das costuras laterais do modelo clássico 501, passando por um processo sucessivas lavagens industriais. O êxito foi faiscante e as lojas tiveram que colocar os clientes em listas de espera.

Laboratório de desenvolvimento e jaqueta Engineered Jeans LEVI’S. Os modelos
desta linha variam entre os jeans clássicos e o total neo-punk

No ano seguinte, a Levi's apresentou uma nova linha de Levi's Engineered Jeans, também assinada por Rikke Corp, considerada uma das dez designers mais influentes do mundo da moda masculina, ao lado de nomes tão conceituados como Hedi Slimane, Tom Ford ou Suzy Menkes. Ela redesenhou a linha original e o resultado foi tão autêntico e icônico como o original. Às costuras torcidas e silhuetas 3D juntaram-se variados detalhes estéticos, como remendos cosidos à mão, que evidenciam a paixão de Rikke Corp pelo artesanato e diferenciam totalmente a nova geração de produtos da Levi's Engineered Jeans. Outra das grandes inovações da nova linha em denim foi a utilização de algodão orgânico. Pensando especialmente nos admiradores incondicionais desta linha, a coleção integrou ainda alguns dos modelos mais representativos das últimas coleções LEJ, sob o nome de Icons (Ícones).
Como vimos, ao longo de sua trajetória, o jeans nasceu masculino, nas minas de ouro, virou country, rendeu-se à sensualidade feminina, transformou-se no figurino dos grandes roqueiros, tornou-se signo de liberdade com os hippies, atrelou-se aos movimentos de contracultura nos anos 60, consagrando-se como símbolo de juventude. Contribui para as revoluções sexual, social e da indústria têxtil e de confecções. No final do milênio, ganhou individualidade e design ergonômico. Através do conceito de premium jeans elevou-se à categoria de artigos de luxo, virando símbolo de status social e de reconhecimento. De acordo com a jornalista Patrícia Carta, traduz-se num verdadeiro ícone azul.

Jeans de luxo, bolsa LOUIS VUITTON em patchwork de denim, R$ 9.150,00, anúncio
veiculado na Revista Vogue Brasil, nº 343, Março de 2007, p. 210

Autora: Silvana Zibetti
Fonte:
ZIBETTI, Silvana. Jeans, um símbolo da cultura jovem. Dissertação (Mestrado Mídia e Cultura) – Faculdade de Comunicação e Turismo, Universidade de Marília, Marília, 2007.

2 comentários:

Damyller disse...

Adoramos o texto. Somos uma empresa de jeans e tudo que ronda esse universo nos interessa.
Um grande abraço:)

Anônimo disse...

olá.descobri seu blog hj,muito legal a postagem sobre jeans,sou modelista e trabalho muito com jeans.
tenho um site ond vendo moldes desenvolvidos no audaces.
www.fabricademodelagens.com.br.
abraço